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No Piauí, 83% dos adolescentes infratores são negros ou pardos, diz Direitos Humanos

Levantamento foi realizado pelo Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), por meio do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE).

05/12/2023 às 14h26

Um levantamento realizado pelo Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), por meio do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) revelou que, no Piauí, 112 menores infratores estão em unidades socioeducativas para ressocialização. Destes, 83% são negros ou pardos e 17% são brancos. Quase a totalidade são de meninos (109, sendo apenas três meninas).

Adolescentes infratores no Piauí. - (Jailson Soares/O Dia) Jailson Soares/O Dia
Adolescentes infratores no Piauí.

Os adolescentes estão distribuídos em 12 unidades socioeducacionais pelo Estado, o que representa 2,6% das unidades do país. No Brasil, a coleta de dados de 2023 mostrou que as unidades contam com 11.556 adolescentes no sistema socioeducativo. No número nacional, é verificado que a presença de negros e pardos é maior em relação aos brancos.

Para a professora Raquel Costa, Doutora em História Social e Coordenadora do Neabi, o Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Afro-Brasileiros e Indígenas, o número é um reflexo do racismo estrutural, que perdura desde escravidão, passando pela libertação dos escravos e até a sociedade atual.

A pele negra é a pele-alvo, principalmente das abordagens policiais, no Brasil e no Piauí. E esses dados têm acompanhado o que já sabemos da realidade dos anos anteriores, que nos mostram o quanto o racismo está profundamente enraizado em nossa sociedade. E o Piauí, que durante muito tempo negou a sua negritude, não fica fora dessa realidade. A violência é constantemente direcionada ao corpo negro e os jovens negros não ficariam de fora dessa realidade, alvo do racismo institucional, inclusive, representado nesse caso pelo aparato policial

Raquel CostaDoutora em História Social

“Já existem estudos que nos mostram que os jovens negros são alvo do policiamento ostensivo e das formas mais violentas de ação policial. Por isso os dados mostram a maioria de jovens cumprindo medidas socioeducativas. Mas também se a gente for pensar na população carcerária, os jovens representam 54,8% desse público e da população carcerária como um todo, a população negra é a maioria”, relatou Raquel Costa.

CEM, Centro Educacional Masculino - (Jailson Soares/O Dia) Jailson Soares/O Dia
CEM, Centro Educacional Masculino

Algo que, na avaliação da professora e pesquisadora, é uma construção histórica. “A pessoa negra é perseguida, ela é esse alvo de policiamento, de vigilância, de suspeita. Isso aconteceu desde antes da libertação da população negra no Brasil. Os homens e mulheres, escravizados e escravizadas, também eram alvo do aparato policial no século XIX. E, após a emancipação os jovens, os homens e mulheres negras continuam sendo alvo desse aparato policial, mas também de todo esse racismo estrutural que está aí representado nas instituições” complementa.

O contexto desfavorável aos negros e pardos requer, segundo a Doutora em História Social, o reconhecimento do racismo como um problema de todos. “Tudo isso é consequência do racismo que existe na sociedade brasileira e que montou essa sociedade e que inclusive é fundamental para o funcionamento dessa sociedade”.

“Então, é necessário inicialmente várias políticas públicas, entre elas pensando aqui a questão da educação, uma educação antirracista, um letramento racial, mas que também leve a ações antirracista e ao reconhecimento de um privilégio da branquitude”, finalizou.

Sobre a pesquisa

Após seis anos, o MDHC, retomou o processo de coleta, análise e publicização dos dados nacionais relativos à Política Nacional de Atendimento Socioeducativo no país. O Levantamento Nacional de dados do SINASE 2023 traz dados referentes ao primeiro semestre do ano deste ano com informações de adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas de restrição e privação de liberdade em todas as unidades federativas.

No Brasil, a Política Nacional de Atendimento Socioeducativo para adolescentes foi inserida no Sistema de Justiça Juvenil e tem bases firmadas na Constituição Federal (Brasil, 1988) e no Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Brasil, 1990). As diretrizes estão também na Doutrina da Proteção Integral e na mudança paradigmática no tocante à atenção e aos direitos de crianças e adolescentes.

Foi especialmente a partir do artigo 227 da Constituição Federal que crianças e adolescentes passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direitos, em situação peculiar de desenvolvimento e com prioridade absoluta.