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Quarta parede

por Nathalia Amaral

Maníaco do Parque (2024): a novelização do true crime

Com roteiro fraco e protagonista insossa, o Maníaco do Parque dá uma aula de como não fazer uma obra de true crime.

24/10/2024 às 21h37

24/10/2024 às 21h37

Quem viveu o final dos anos 90 está familiarizado, de alguma forma, com um dos casos de assassinatos em série mais populares do Brasil. Os crimes cometidos por Chico Estrela, no Parque do Estado, em São Paulo, fizeram parte do imaginário popular por muitos anos e, não à toa, viraram o tema central do longa intitulado com o codinome dado ao assassino: Maníaco do Parque.

Confesso que eu estava, de certa forma, ansiosa por assistir a trama. Afinal, os assassinatos cometidos por Chico Estrela e a sua figura eram temas recorrentes de discussão em todos os lugares e, por isso, uma das minhas maiores fontes de medo na infância. Quem não lembra da reportagem emblemática de um certo programa dominical, em que um ator, se bem me lembro, tenta convencer as mulheres a irem até um parque sob a promessa de tirar fotos para uma campanha publicitária? Uma tentativa, antiética, para não ser o mínimo, de mostrar o quão era ‘fácil’ cometer os crimes em uma cidade como São Paulo. Todos os domingos bastava ligar a televisão e a figura dele estava lá: o temido assassino responsável por matar e violentar mulheres em uma das maiores metrópoles do mundo.

Maníaco do Parque (2024): a novelização do true crime - (Divulgação) Divulgação
Maníaco do Parque (2024): a novelização do true crime

E é aí onde há um dos erros mais importantes da trama. Os detalhes sobre o caso do Maníaco do Parque foram exaustivamente debatidos pela imprensa na época, não era necessário criar uma trama fictícia para tentar abarcar uma ideia que já existe e, cujos detalhes, são inúmeros.

A ideia de vender a imagem da jornalista Elena como heroína da história, por exemplo, é outro ponto desconexo. Por mais que eu consiga compreender a necessidade de tirar o foco do serial killer e não enaltecer o algoz daquelas mulheres, é preciso ir além. A personagem não convence nas suas motivações, nas suas ações e muito menos no seu discurso. A relação de fundo entre a personagem e o seu pai não faz sentido, não tem profundidade e parece ter sido colocada ali apenas para justificar a obstinação dela em fazer um bom trabalho. Como se mulheres, por si só, não fossem capazes de fazer isso sem ter “daddy issues”.

A trama parece ter sido muito influenciada pelo debate que se surgiu após a série Dahmer, em que, ao colocar o holofote sobre o serial killer, o público percebeu que as histórias que realmente importavam, a das vítimas, foram deixadas de lado. Aqui, eles tentam corrigir isso, mas não a contento. Não há, por exemplo, qualquer identificação do telespectador com uma das vítimas do Maníaco do Parque, é difícil até terminar o filme lembrando do nome de alguma delas. O que dizer, então, do embate final entre as personagens de Elena e Chico Estrela? Não faz sentido e não tem nenhum propósito que não seja reforçar um discurso que está explicitado apenas na fala da personagem de Elena durante todo o longa, mas que não ganha profundidade em nenhum momento na tela.

A atuação do Silvero Pereira como Chico Estrela é louvável. As mudanças de expressões no decorrer do filme, quando está se colocando em uma situação de submissão e ao dominar as vítimas, é incrível. A estrela do filme, no entanto, parece ficar apagada na tentativa de forçar a narrativa do jornalismo investigativo como o fio condutor da história. O filme perde ao tirar o foco da sua genialidade enquanto ator por medo de assumir ser aquilo que é: uma obra de true crime.